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Uma nova forma de avaliação dos hospitais.

Palavras-chave: Hospitais, Avaliação, Medicina. 

A medicina americana sempre foi muito centrada no atendimento hospitalar, embora nos últimos anos muitas coisas tenham mudado e os conceitos e estratégias da saúde pública são cada vez mais utilizados.  Mas nos Estados Unidos (EUA) o número de hospitais gigantescos, que são grandes corporações, é realmente assustador. Os complexos hospitalares representam uma fatia econômica importante naquele país.

Há alguns anos, são divulgados rankings ou classificações dos hospitais na América. Um dos mais famosos é o U.S News & World Report´s Best Hospitals anual rankings. Teve início em 1990 e a última edição comparou mais de 4500 centros médicos, em 16 especialidades e 10 procedimentos e condições.

A metodologia utilizada no U.S News se baseia em dados objetivos como: taxas de sobrevida ajustadas por risco, índices de alta hospitalares, volume de pacientes atendidos, qualidade do atendimento de enfermagem, e outras medidas relacionadas aos cuidados do paciente.

A revista americana Newsweek, em parceria com uma empresa de análise de dados, também começou a publicar um ranking de hospitais. Essa análise englobou 21 países, inclusive o Brasil. A sua metodologia se baseou em pesquisas com médicos, profissionais de saúde e administradores. Também foram avaliados por um conselho de especialistas indicadores médicos e hospitalares de desempenho.

Mais recentemente foi introduzido uma nova classificação ou ranking de hospitais nos EUA. Para posicionar os hospitais, levou em consideração não apenas as tradicionais supostas  medidas  de qualidade mas especialmente o quanto os hospitais apresentam políticas para servir suas comunidades e são capazes de evitar cuidados desnecessários.

No novo ranking, foram avaliados 3282 hospitais americanos. Foi feito pelo Instituto Lown, uma organização sem fins lucrativos, localizada em Brookline, Massachusetts (EUA). Para pontuarem bem, os hospitais tinham que demonstrar além de bons cuidados clínicos, ter o que eles chamaram de “liderança cívica” (realização de caridade, prover ajuda financeira, atender pacientes de menor renda ou nível educacional, etc.). Também deveriam evitar a realização de 13 procedimentos, classificados como sendo de benefício questionável ou ausente aos pacientes.

Outra métrica utilizada foi a comparação dos salários dos gestores executivos dos hospitais com a de seus funcionários. Em média os gestores ganhavam 8 vezes mais do que os funcionários, mas alguns 20, 30 ou 80 vezes mais, mesmo em instituições consideradas sem fins lucrativos.  Sabe-se que tanto nos Estados Unidos, quanto nosso meio, os salários dos gestores da saúde tornam-se cada vez mais altos, ressaltando cada vez mais a visão do sistema como um grande negócio.

Dentre os procedimentos citados como sendo de uso exagerado e de pouco benefício aos pacientes, e que foram avaliados, citam-se: artroscopias de joelhos, fusões espinhais, eletroencefalogramas para cefaleias, histerectomias para condições benignas como os miomas uterinos e colocação de stents em artérias renais. Muitos hospitais realizam uma alta quantidade de procedimentos chamados de “baixa qualidade”, como os listados acima. Isso obviamente visa o lucro exagerado e estima-se que podem causar gastos ao sistema de saúde americano ao redor de 100 bilhões de dólares por ano.

Para o Instituto Lown, o hospital tem a obrigação de melhorar a saúde da comunidade em que atua, e fazer o melhor para os pacientes obviamente (sem distorções financeiras visando o lucro abusivo).   

Para a surpresa de muitos, muitos hospitais que apresentavam boas posições em rankings tradicionais, não classificaram muito bem quando os novos parâmetros eram levados em conta.

Um dos modelos econômicos predominantes de assistência hospitalar se baseia no chamado “fee for service”. Quanto mais volume de internação, procedimentos e exames um hospital fizer, mais ele ganha. Em outras palavras: incentiva-se a doença e o número exagerado de métodos diagnósticos e terapêuticos. Se um paciente fizer uma cirurgia e apresentar complicações, ficará mais tempo internado, suas despesas hospitalares serão maiores e consequentemente os ganhos do hospital aumentarão. Essa é a realidade.  Isso acaba gerando distorções graves, com prejuízos aos pacientes e encarecimento do sistema de saúde. Como consequência, os convênios médicos acabam por repassar os custos para os consumidores. Hipertrofia-se muito a parte administrativa e de cobranças, o que também encarece mais ainda o sistema. Um perverso e burocrático círculo vicioso.

Já há algum tempo se discute a necessidade de reformulação do sistema de cobrança dos hospitais, enfatizando a necessidade de remuneração fixa, justa e baseada em qualidade de atendimento e não em volume.  Os hospitais precisam ser transparentes e idealmente terem seus dados de cuidados aos pacientes divulgados publicamente. Quem sabe, novos sistemas de avaliação, como o utilizado pelo Instituto Lown, possam se tornar rotineiros. Os hospitais precisam ser constantemente escrutinizados e serem vistos cada vez mais como realmente promotores da saúde.

Referências:

1- https://www.statnews.com/2020/07/07/new-hospital-ranking-counts-doing-good-nearly-as-much-as-doing-well/

2- https://www.usatoday.com/story/news/health/2020/07/06/lown-institute-hospital-rankings-community-commitment/5385381002/

3- https://www.medpagetoday.com/hospitalbasedmedicine/generalhospitalpractice/87770?xid=fb_o&trw=no

4- https://www.newsweek.com/best-hospitals-2020/brazil


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